Esse é o meu último. Eu juro.
É a última vez que vejo suas mãos. Aqueles dedos que ficam firmes em uma posição, aguardando o toque tímido das minhas falanges. Elas escorregam sobre eles, sentindo em uma fração de segundos a topografia de sua pele, cada uma das quadrículas e polígonos que formam a superfície das costas de seus dedos. Você me olha e diz que sou esquisito.
Vejo, então, seus olhos pela
última vez. Eles se fixam nos meus, e eu não aguento a pressão. Desvio para
pensar. E quando volto a falar, só consigo passear minha visão pela esclerótica
e pupila que estão marcadas em você. Talvez alguém pudesse dizer que seus olhos
são profundos. Um poeta diria que se perderia em suas imensidões. Não eu. Para
mim, eles são rasos. E isso é o que mais amo neles: sei que posso adentrar
essas águas sem o risco de me afogar. São rasos, são seguros. São tão vívidos.
Como a gente poderia morrer em uma banheira repleta de vida? Você sorri e diz
que sou bobo.
Pela última vez, vejo seus
lábios. A boca que nunca provei. Apenas imagino que seja tão repleta de sabor
quanto a sua alma, temperada com toques de pimenta e mel. Queria que algum
papiloscopista pudesse desvendar a marca de seus lábios em meu polegar. Observaria
que foram tocados com a delicadeza que mereceram, e encontraria dois arcos
opostos por um vazio: o seu beijo na digital. E quando eles se abrem para
sorrir, a concepção de tempo torna-se braudeliana. Eu os observo quando você
não me olha. Você me abraça e diz que sou único.
A última despedida chega em forma de abraço. Tenho medo de lhe machucar. Sou firme, mas gentil. Viro a cabeça mais para a direita apenas para sentir o seu cheiro. É uma mistura de gratidão com saudade, e ele marca a minha roupa. Fecho os olhos porque sei que você não pode me ver. Aproveito os segundos porque eles serão os últimos. Sinto o calor sumir, seu corpo se descola do meu. Diz alguma coisa carinhosa. Eu, esquisito, bobo e único, respondo qualquer coisa sem pensar. Você é uma dose pura de uísque. Você se vira e vai embora.
Esse foi o meu último. Eu juro.
Sempre é o último.