A mãe sempre foi uma mulher forte. Talvez a mais forte que já existiu. Gosto de pensar nela como uma grande árvore que dá abrigo, sombra, e não se dobra ao vento. Eu queria ser assim também. Mas sou diferente, de um outro modo. E hoje percebo que existem vários tipos de “força”, e que todos são válidos, mesmo que alguns nos inspirem mais do que os outros. Eu tive de lutar comigo mesmo por quase uma vida inteira para aceitar o fato de que eu posso, sim, ter momentos de fraqueza, e que eles não me tornam fraco. Ao contrário: reconhecê-los, encará-los e aceitá-los são a minha força, uma vez que passar pelas coisas e ainda assim me manter em pé todos os dias demonstra que, de certo modo, sou especial em meu mundo.
A mãe, embora forte, nunca se
permitiu guardar as emoções. Estou acostumado a ver suas lágrimas, de alegrias
e tristezas, desde que nasci. Puxei ao pai, no entanto, durante meu crescimento:
aguentando a dor sem molhar os olhos. Hoje entendo que isso não foi bom para
mim, que eu deveria ter, sim, deixado sair de mim, em forma de água salgada, as
ocasiões em que me senti humilhado, machucado ou diminuído. Isso teria me dado
ânimo para superar muitas coisas que levei anos para enterrar. E talvez eu
pudesse ter enfrentado o meu período de tentativa de suicídio de maneira mais
corajosa se soubesse que chorar iria amenizar uma parte de minhas dores.
A mãe tem saúde frágil. E eu
nunca a vi chorar por causa disso. Ela já passou por operações, já teve partes
de seu corpo tiradas de si, e jamais a vi chorando na cama do hospital ou
durante sua recuperação domiciliar. Ela deve fazer isso pela gente,
provavelmente. Manter a positividade mesmo em situações adversas. Talvez ela
chore antes de dormir ou enquanto se banha, mas isso eu jamais saberei. Gosto
de pensar que, nesse ponto, sou um pouquinho parecida com ela: a dor física
sempre machuca, mas não o suficiente para arrancar lágrimas. Tenho passado os
últimos meses sentindo uma dor constante, que nunca dá trégua. Alguns dias mal
consigo andar. Mas aguento a dor e continuo fazendo o que tenho de fazer, seja
andando para cumprir meus compromissos, seja passando horas sentado dando
aulas. Isso não faz de mim ninguém especial para o mundo, é claro. Mas, no meu
mundo, eu preciso enxergar que existe resiliência em mim também, e que isso me
fortalece.
A mãe não tem ideia de muitas
coisas que se passam. Ela esteve no hospital novamente esses dias e eu sequer
estava perto. Mas falei com ela e respondi que “sim, está tudo bem, por aqui
está tudo bem, estou estudando para a prova, sim, os gatos pulam a janela, sim,
minha amiga está bem, sim, está tudo bem, não, não estou com a voz estranha,
estou apenas cansado de estudar, sabe?”. E ela nunca soube que eu tive de ser
forte por ela, que eu estava muito chateado e que havia chorado ao telefone um
pouco antes ao conversar com uma amiga. E que se eu não tivesse aprendido a
chorar, provavelmente não conseguiria estar ali para dar ânimo em sua
recuperação. Isso é força também.
E fui aprendendo a lidar com
quem pensa o contrário, com quem vê, em um instante de fragilidade, a brecha
para apontar “fraqueza”. Não devo nada a ninguém. Cada pessoa tem sua história
de vida e respeito tudo isso: quem chora, quem não chora; quem aprendeu a
chorar, quem não quer saber disso. Apesar de todos os momentos ruins ao longo
da existência, recentemente descobri, talvez, o meu maior ponto de força: eu
tenho uma concentração absurda nas coisas que devo realizar mesmo se o mundo ao
redor estiver desmoronando.
A mãe chorou de novo essa
semana. E eu chorei junto, abraçado a ela. A minha força na adversidade me fez
conquistar um sonho antigo. E agora vou poder cuidar um pouco melhor da saúde
dela.