Ao falar, mantinha os olhos afastados de quem escutava, ao
seu lado.
"Eu não saberia dar valor a tudo isso. Não eu. Nada disso me é necessário;
ou me importa...
"Não sei como lhe explicar... mas... imagine uma fotografia. Colorida. Uma
paisagem, talvez. E nessa foto há um destaque feito com caneta. Você seria esse
destaque, entende? Agora... esse tipo de fotografia seria o comum para as
pessoas. O correto, penso eu, seriam todos pensarem dessa maneira.
"Porém, comigo é diferente. É como se a fotografia estivesse em preto e
branco e você fosse a única coisa colorida nela. Percebe a diferença? Você não
faz parte do todo, é única. E, para mim, esse todo não tem importância alguma.
"Enfim, não se culpe. Eu é que vejo tudo deformado. Sempre observei as
fotos sem cor. Sempre. Ou seja, nada disso me importa. E você foi uma cor nisso
tudo, mas, na essência, eu continuei a não enxergar a coloração da vida."
Era aquela maldita caveira novamente. - Ei, puto, chegue cá! E ela veio, meio cambaleante, com seu ritmado compasso de fêmur. Caveira mexicana. Sorria com os amarelados-pontos-temerosos-de-dentistas. Trazia um charuto entre os finos dedos da ossatura direita. - Mas o que faz aqui novamente, peste? - Sabe como é, caveirando... Invejando os que têm carne. - Porra, esse povo deve tomar um susto, hein! - Nem me fale. Não sei porque tanto medo. Uma caveirinha tão simpática como eu. Coçou as costelas. - O que é isso aí? - Isso o que? - Preso aí, velho. - Presente para usted. E retirou uma grande garrafa de rum. - Conseguiu onde? - Dei sorte. Geralmente nessa época, só encontro aguardente sem graça. Isso eu roubei de macumba de rico. Ele cuspiu. - Cacete, macumba?!